Discute-se muito a baixa qualidade do ensino público, com
efeitos sobre as classes de menor poder aquisitivo. Deveriam também causar
aflição sérios tropeços das escolas privadas, inclusive as que obtêm as
melhores notas no Exame Nacional do Ensino Médio (Enem). Esses problemas, que
passam despercebidos pela maioria dos pais e educadores, afetam jovens das
classes mais altas, supostos candidatos mais prováveis à elite intelectual do
País.
Os pais precisam desde cedo decidir se o plano para seu
filho é aprender ou passar no vestibular. É possível aprender e passar no
vestibular, mas é limitada e frustrante a trajetória intelectual da criança
cujos pais estabelecem como meta o vestibular, não o aprendizado.As escolas chamadas "convencionais" parecem ter por objetivo boas notas no Enem e no vestibular, não propriamente o aprendizado. Há crescente pressão dos pais nesse sentido. Não percebem que educação voltada para a competição e o vestibular é, acima de tudo, desinteressante para a criança. E sem interesse não há aprendizado.
A educação voltada para o vestibular busca prioritariamente
habilitar o profissional a competir dentro de padrões estabelecidos por uma
conveniência de massificação. Talentosos e ignorantes são, juntos, conduzidos
como gado para uma mesma faixa de referência na vizinhança da média.
Os mais inteligentes (não necessariamente os mais bem
treinados para tirar notas) não têm oportunidade de seguir seus processos
próprios de exploração, retenção e desenvolvimento intelectual. São forçados a seguir
método desenhado com requisitos mínimos para a compreensão dos medíocres.
A ideia de permitir que desponte uma elite intelectual sofre
resistência, silenciosamente. Por séculos de tradição aristocrática, a elite,
ainda que tivesse maior oportunidade de desenvolvimento intelectual, dominou
pelos sobrenomes, não por méritos pessoais. A democracia trouxe o desprezo pela
elite e a noção irrefletida de que todos devem ser iguais. Grande erro! Todos
não devem ser iguais, mas devem, sim, ter iguais oportunidades de
desenvolvimento de suas habilidades. E os mais talentosos devem ser estimulados
e prestigiados.
Cada pai deve empenhar-se em livrar os filhos da cultura da
comparação, que os aprisiona na mediocridade, e habilitá-los a usufruir
plenamente seus talentos, tendo por referência apenas a excelência, não a
concorrência.
O jovem deve, sim, ter disciplina, mas não aprender por
disciplina. Equívoco corriqueiro é estabelecer que aprender e tirar boas notas
são obrigações da criança. Só se aprende por interesse. Para uma criança, as
obrigações são chatas e desinteressantes. Toda criança sadia, minimamente bem
educada e com ambiente emocional estimulante é capaz de aprender. Basta que o
aprendizado seja interessante. Se lhe for apresentado como obrigação, contudo,
o melhor que uma criança disciplinada fará é decorar, o que ajuda a tirar notas
e passar no vestibular, mas não a integrar o conhecimento ao processo mental,
ou seja, aprender.
Notas não avaliam a criança, mas a capacidade de ensinar e
de disciplinar das escolas e dos pais, que, portanto, exigem boas notas em
benefício de sua própria imagem na sociedade, não em benefício da criança. Boas
notas não preparam a criança para uma vida de realizações.
O típico adulto moderno dá prioridade ao cultivo de seu
próprio sucesso, numa rotina, no mais das vezes, intelectualmente improdutiva.
Mais fácil é não se envolver na formação intelectual dos filhos, não ler para
eles sobre a História do homem, não explicar por que a Terra é redonda, o que
são as estrelas, a origem da vida, a evolução e as diferenças das espécies, não
ensinar a brincar com números (no lugar de videogames, que mantêm a criança
abobalhada), não despertar logo cedo o interesse pelo conhecimento, a
curiosidade pelas coisas da natureza.
Mais conveniente é terceirizar por completo a educação,
entregar as crianças à escola e esperar que voltem com um diploma, que não diz
que o filho se tornou uma pessoa instruída, mas apenas que os pais cumpriram o
seu dever segundo a convenção dos nossos tempos. Para o filho pouco serve
aquele canudo, senão, talvez, para arrumar um emprego. Para o pai o diploma do
filho é uma sentença absolutória da negligência intelectual a que abandonou a
cria.
Formam-se legiões de burros, rasos, ignorantes, imaturos com
diplomas (muitos com boas notas!). Pessoas destituídas da oportunidade de
desenvolver seus talentos individuais. Enlatadas, padronizadas, comoditizadas.
Dirão os pais que bem preparadas para competir no mundo moderno, mas, na
verdade, aleijadas de suas competências subjetivas e jogadas para competir na
mediocridade a que foram rebaixadas.
Não é à toa que no curso da educação moderna pessoas
brilhantes - de Winston Churchill, Albert Einstein e Warren Buffett a Bill
Gates e Steve Jobs - em algum momento se desgarraram da educação convencional
ou a deixaram ter influência secundária em sua formação intelectual. São
pessoas que se recusaram a entrar na competição e se desenvolveram muito acima
dela.
"Aprendizagem que privilegia apenas o intelecto
dificilmente atinge o ser humano completo. O melhor exemplo disso são as
informações formatadas exclusivamente para o vestibular. É um rio que passa na
vida do vestibulando e que deságua no oceano do esquecimento… Quando a gente
aprende algo e dele não se esquece nunca mais, é porque o coração e a alma
também foram tocados… Quando o conhecimento é elaborado no intelecto, passa
pelo sentimento e determina uma vontade, aí, sim, ele não desgruda mais da
gente." (Helena Trevisan)
Extraído do Blog do Noblat em 01-01-12
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