Professora Dra. Maria Valeriana Moura-Ribeiro
O desenvolvimento físico geral na criança tem efeito importante para as competências e habilidades na vida adulta. Evidências crescentes de investimentos no período inicial da vida da criança, nas gestantes envolvendo o concepto, repercutem na cognição, aprendizado e comportamento.
A melhoria das condições nutricionais, do controle de infecções, da redução numérica de integrantes da família, condicionou redução da mortalidade; melhorou a expectativa de vida; aumentou a estatura média da população, com benefícios visíveis no adulto.
Que fatores relacionados à vida
inicial, beneficiariam a saúde mental e física das crianças no transcorrer da
primeira infância?
Na formação normal do sistema nervoso
e, em particular do neocórtex humano, está bem caracterizada a multiplicação
neuronal (neuronogênese), migração (radial, horizontal), amadurecimento neural
glial, dos vasos sanguíneos, mielinização, organização de redes neurais com
progressivo aumento da conectividade nas idades chaves de crianças. As vivências envolvendo fenômenos adversos em idade precoce (intra útero e nos primeiros anos de vida) podem interferir no constructo biológico estrutural e funcional, modificando constituintes neuroquímicos.
Conhecendo a multiplicidade de áreas inter-relacionadas, com funcionalidade dinâmica bioquímica (neurotransmissores, aminoácidos, micro elementos) é possível compreender o impacto de experiências com agentes agressores em qualquer das etapas (embrionária, fetal e neonatal).
As pesquisas realizados em animais e seres humanos, têm oferecido evidencias substanciais dos efeitos da nutrição, das experiências nos primeiros anos de vida, sobre o desenvolvimento cerebral, com repercussão nas habilidades de enfrentamentos, comportamento e, na saúde geral, nos estágios evolutivos sequenciais da vida.
O desenvolvimento cerebral normal e as experiências no transcorrer da primeira infância, têm sido melhor compreendidas com estudos da psiconeuroendocrinologia e psiconeuroimunologia. Estímulos sensoriais externos ou internos ao cérebro, através do sistema glandular, hipotálamo-pituitário-adrenal (HPA), podem determinar produção ampliada de corticosteróides e comprometimento expressivo do sistema nervoso autônomo.
Os níveis e a duração desses esteróides no sangue afetam sistemas e órgãos, incluindo o cérebro, que por sua vez, por retro alimentação, regula a liberação de esteróides.
Nesse processo, existe comprometimento de circuitos neurais envolvendo hipocampo e sistema límbico, e dessa forma, influenciando o comportamento, a função cognitiva com envolvimento dos mecanismos de memória. O hipocampo constitui estrutura participante ativa, não somente do sistema límbico-hipotalâmico-pituitária-adrenal-cortical, como também do córtex pré-frontal. Os níveis elevados, crônicos de esteróides, podem causar perdas de neurônios no hipocampo, com repercussão na memória e comportamento.
Vários estudos realizados em animais, e observações em seres humanos, têm conclusivamente revelado que as conexões e o amadurecimento cerebral, se mantêm com dinamicidade expressiva durante os primeiros anos de vida.
No entanto, esta situação pode ser substancialmente afetada pela redução de estímulos recebidos no transcorre do neurodesenvolvimento, com projeção na qualidade do aprendizado acadêmico.
Todavia, esses efeitos não são radicais, podendo ocorrer reversão funcional dinâmica frente aos estímulos direcionados à reabilitação nos períodos sensíveis, em função da organização de novas interconexões neuronais. Essas constatações têm sido validadas em experimentos envolvendo circuitos sensoriais, visuais, auditivos, entre outros.
Os recentes estudos através de imagens no cérebro humano (ressonância magnética funcional, tratografia e tomografia por emissão de pósitron), têm revelado que o desenvolvimento cerebral é muito ativo nos primeiros anos de vida, com declínio dessa atividade na segunda década, registrando valores funcionais semelhantes aos evidenciados nos adultos.
Concomitantemente, é necessário reconhecer a influência, sobre a primeira infância, da interação de genes, ambiente e efeitos imunológicos. Nessa abordagem, estudos em macacos Rhesus, sob condição de estresse, caracterizou o desenvolvimento de ansiedade e depressão, particularmente quando separado da mãe. Nessa situação, foram identificados elevados níveis de esteróides, baixo níveis de serotonina no cérebro, com comprometimento do ritmo circadiano.
Concluindo, o desenvolvimento inicial no ser humano, depende das experiências precoces, recebendo influência da nutrição e dos estímulos proporcionados pelos pais e ambiente.
REFERÊNCIAS
Chugani HT, Phelps ME, Mazziotta JC,
1987. Positron
Emission Tomography Study of Human Brain Functional Development. Annals of Neurology 22(4):487-97.
Moura-Ribeiro MVL, 2012. Primeiras Experiências e Consequência no
Neurodesenvolvimento de Crian-ças. In:Riechi e Moura-Ribeiro: Desenvolvimento
de Crianças Nascidas Pré-Termo / Interface Biopsicos-social. Ed. Revinter.
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