O tratamento medicamentoso e a terapia comportamental são
considerados como tratamentos eficazes para o TDAH; a combinação desses
tratamentos é geralmente vista como abordagem ideal para muitas crianças.
Entretanto, no Estudo de Tratamento Multimodal do TDAH (MTA Study), o maior
estudo de tratamento do TDAH já feito, o benefício do tratamento combinado
comparado com o tratamento medicamentoso isolado, embora significativo para
algumas medidas, não foi especialmente robusto. Isso levou alguns profissionais
a questionar se a terapia comportamental era necessária quando uma criança
fosse tratada eficazmente com a medicação, isto é, a terapia comportamental
faria um diferença o bastante para valer à pena? (Para uma revisão do conjunto
inicial de achados do MTA Study, veja www.helpforadd.com/mta-study/.
Uma das limitações de muitos estudos iniciais que examinavam
o tratamento combinado - incluindo o MTA - foi a de que os benefícios
adicionais da terapia comportamental foram examinados no contexto de uma dose
otimizada de medicação. Por exemplo, cada criança do estudo MTA começou o
tratamento medicamentoso com uma triagem intensiva, controlada por placebo,
para determinar sua dose mais eficaz. Assim, os benefícios da adição do
tratamento comportamental à medicação foram avaliados no contexto de um regime
de dosagem otimizada. Falando de modo geral, os benefícios adicionais do
tratamento comportamental, quando avaliados nesse contexto, são, no melhor dos
casos, modestos.
Entretanto, o tratamento medicamentoso feito nas comunidades
raramente é realizado em condições de otimizar os benefícios. E uma questão
inteiramente diferente, mas importante, é saber se combinar a terapia comportamental
com a medicação pode diminuir, de maneira significativa, a dose da medicação
necessária para atingir o controle eficaz dos sintomas.
Esse seria um resultado
importante porque o tratamento prolongado com medicação estimulante pode estar
associado a diminuição do crescimento. Doses mais baixas podem diminuir os
efeitos de supressão do crescimento, estar associadas a diminuição dos efeitos
colaterais, e serem mais bem aceitas por famílias preocupadas com o uso de
medicamentos em seus filhos.
Um estudo publicado recentemente
online no Journal of Abnormal Child
Psychology [Pelham et al (2014) - A dose-ranging
study of behavioral and pharmacological treatment in social settings for
children with ADHD, DOI 10,1007/s10802-013-9843-8 ] avalia cuidadosamente esse
importante aspecto. Os participantes foram 48 crianças com TDAH, de 5 a 12 anos
de idade, que estavam participando de intensivo programa de tratamento de verão
(STP). O SPT era de 9 horas ao dia e durou 9 semanas. As crianças passavam 2
horas todos os dias em atividades acadêmicas, e o restante de cada dia em
grupos de atividades recreativas semelhantes às de um acampamento normal de
verão (como é de costume nos Estados Unidos).
Tratamentos
Medicação
- Durante o STP, as crianças receberam
três doses diferentes de medicação estimulante, isto é, baixa, média e alta,
além de placebo. A medicação era metilfenidato de efeito curto (a forma
genérica da Ritalina) e foi administrada 3 vezes ao dia. A dose da medicação
era mudada diariamente e o pessoal do STP não sabia o que a criança havia
tomado a cada dia.
Terapia
comportamental - A terapia comportamental foi realizada com duas variantes:
baixa intensidade e alta intensidade. Em ambos os casos, o tratamento incluía
um sistema de pontuação para promover o comportamento desejado, regras e
expectativas claramente estabelecidas, treinamento para desenvolver habilidades
sociais e resolver problemas sociais, elogio social e reforço, treinamento de
habilidades atléticas, e o uso de recompensas diárias e semanais.
A principal diferença foi que, na condição de baixa
intensidade, cada elemento foi modificado para que necessitasse de menor
esforço para ser fornecido. Por exemplo, na condição de alta intensidade, as
crianças ganhavam e perdiam pontos durante o dia com base em seu comportamento.
na condição de baixa intensidade, as crianças recebiam feedback sobre seu
comportamento mas não ganhavam ou perdiam pontos.
De modo semelhante, embora o
conteúdo das lições de habilidades sociais fosse similar, na condição de menor
intensidade, o feedback das habilidades sociais não era incorporado nas
atividades diárias e o treinamento para resolver problemas sociais não era
fornecido. Recompensas por bom comportamento eram fornecidas em base semanal e
não diária.
O
Desenho do Estudo
O desenho básico do estudo variava a dose da medicação -
placebo, baixa, média, alta - com tratamento comportamental - nenhum, baixa
intensidade, alta intensidade - de modo que o comportamento das crianças em
cada combinação de tratamento pudesse ser avaliado. Assim, cada criança foi
avaliada durante todas as combinações possíveis de dose de medicamento e
terapia comportamental. Isso permitiu aos pesquisadores determinar, por
exemplo, como uma dose baixa da medicação combinada com terapia comportamental
de baixa intensidade se comparava a uma dose alta de medicação sozinha.
Medida
dos efeitos
A avaliação do comportamento das crianças durante cada
combinação de medicação e terapia comportamental foi feita por conselheiros. Os
conselheiros eram "cegos" quanto à medicação, mas, como ele faziam o
tratamento comportamental, estavam cientes de em qual condição comportamental a
criança estava inserida, isto é, nenhuma, baixa intensidade, alta intensidade.
A pontuação do principal efeito foi derivada do sistema
diário de pontuação empregado no STP. Por esse sistema, medidas diárias foram
obtidas para cada nível de violação de regras por parte de cada criança, não
cooperação, interrupção, problemas graves de conduta e verbalizações negativas.
Além disso, os conselheiros completaram um diário de pontuação de sintomas de
TDAH, do grau total de prejuízo e dos efeitos colaterais da medicação.
Resultados
Com era esperado, o tratamento medicamentoso na ausência de
modificação do comportamento estava associado a melhora significativa do
comportamento das crianças. E, conforme a dose aumentava, assim também
aumentavam os benefícios - em média - em relação ao comportamento das crianças.
A terapia comportamental na ausência do tratamento
medicamentoso também foi associada a significativa melhora do comportamento ao
longo de várias faixas de medidas. Em geral, o gerenciamento de alta
intensidade do comportamento foi associado a maiores melhoras do comportamento
e redução dos sintomas do TDAH do que o gerenciamento de baixa intensidade do
comportamento.
Os achados realmente interessantes desse estudo são
concernentes à combinação de medicação e tratamento comportamental. Em
virtualmente todas as medidas, a adição de gerenciamento de alta intensidade do
comportamento à mais baixa dosagem de medicação trouxe melhoras comparáveis às
produzidas por altas doses de medicação sozinhas.
Para ser direto, os resultados sugeriram que uma criança
típica com TDAH pode ser tratada com o equivalente a 5 mg de metilfenidato duas
vezes ao dia se ela receber concomitantemente terapia comportamental de
intensidade moderada a alta. Sem a terapia comportamental, a mesma criança
poderia precisar de 20 mg duas vezes ao dia para atingir os mesmos benefícios.
Então, a redução diária de metilfenidato seria de 30 mg/dia. Uma razão para que
isso seja importante é que os efeitos de diminuição do apetite observados nesse
estudo aumentaram substancialmente com o aumento das doses - a porcentagem de
lanche que as crianças ingeriam foi de 81%, 73%, 59% e 45%, com o placebo,
baixa, média e alta dosagem de medicação, respectivamente.
Também é importante notar que para vários dos efeitos,
adicionar terapia comportamental de baixa ou alta intensidade produziu melhoras
com todas as doses de medicação; o tamanho real dessas melhoras frequentemente
foi alto. De modo semelhante, adicionar medicação a qualquer variante de
terapia comportamental foi associado com significativos aumentos de ganhos em
cada dose.
Resumo
e Implicações
Os resultados desse estudo fornecem uma demonstração
convincente de que adicionar terapia comportamental ao tratamento medicamentoso
poderia tornar várias crianças capazes de serem mantidas com doses
significativamente mais baixas de medicação do que em caso contrário. Isso
poderia potencialmente reduzir a diminuição de apetite e talvez a supressão do
crescimento somático que podem estar associados com o tratamento prolongado com
estimulantes; também poderia ser mais confortável para muitos pais que têm restrições
sobre o tratamento medicamentoso dos seus filhos.
Embora esse estudo evidencie a viabilidade dessa abordagem,
é bom notar que a prática usual geralmente não tem essa orientação.
Tipicamente, quando as crianças começam o tratamento medicamentoso do TDAH, o
objetivo do clínico é encontrar a dose que promova os maiores benefícios. A
questão de se os mesmos benefícios poderiam ser obtidos pela combinação de
menos medicação e terapia comportamental geralmente não é resolvida.
Há limitações nesse estudo que devem ser notadas. Em
primeiro lugar, mesmo o tratamento comportamental em "baixa
intensidade" tinha múltiplos componentes e poderia ser difícil para as
famílias sustentá-lo por um longo tempo. Em segundo lugar, o estudo ocorreu em
um contexto de um programa de tratamento intensivo de verão, que é um contexto
muito diferente do que as crianças experimentam em suas vidas diárias. E, os
resultados dos tratamentos foram avaliados por um período de somente 9 semanas,
com as diversas combinações de doses de medicação e intensidade de terapia
comportamental durando períodos ainda mais curtos. Assim, a sustentabilidade
dos efeitos, e a generalização para ambientes mais típicos, ainda esperam por
serem demonstradas.
Apesar dessas limitações, um ponto básico demonstrado por
esse estudo é claro e direto - as doses da medicação podem ser diminuídas
quando tal tratamento é combinado com terapia comportamental bem executada.
Isso pode ser particularmente valioso quando as crianças não forem capazes de
tolerar doses mais altas de medicação e quando houver preocupações em relação à
diminuição do apetite e da supressão do crescimento. Do mesmo modo, doses mais
baixas de medicação podem reduzir a intensidade da terapia comportamental
necessária para a obtenção de bons efeitos. Tais achados complementares falam a
favor do tratamento combinado para muitas crianças com TDAH.
Mais uma vez, obrigado por seu permanente interesse em nosso
boletim. Espero que tenha apreciado o artigo acima e que lhe seja de utilidade.
Sinceramente, David Rabiner, Ph.D.
Research Professor, Dept. of Psychology & Neuroscience, Duke University,
Durham, NC 27708 - USA