A maioria das pessoas é neurologicamente equipada para
determinar o que é importante e motivar-se para o fazer, mesmo quando isso não
for do seu interesse. E há o restante, nós, com déficit de atenção. Por William
Dodson, M.D.
O TDAH é uma condição confusa, contraditória,
inconsistente e frustrante. Ele é muito opressivo para as pessoas que vivem com
ele todos os dias. Os critérios de diagnóstico que foram usados nos últimos 40
anos deixam muitas pessoas em dúvida se têm ou não a condição. Os
diagnosticadores têm longas listas de sintomas para ler e excluir. O DSM
(Diagnostic and Statistical Manual of Mental Disorders) tem 18 critérios e
outras listas de sintomas citam ao redor de 100 traços.
Os profissionais, eu inclusive, têm tentado estabelecer
um modo mais simples e claro de entender os prejuízos do TDAH. Temos procurado
a "linha luminosa e reluzente" que define a condição, explica a fonte
dos problemas e dá a direção do que fazer a respeito.
Meu trabalho na última década sugere que temos esquecido
de algo importante sobre a natureza fundamental do TDAH. Fui procurar os
especialistas nessa condição - as centenas de pessoas e seus familiares com
quem trabalhei e que foram diagnosticados com o TDAH - para confirmar minha
hipótese. Minha meta era procurar a característica que todos os com TDAH têm, e
que as pessoas neurotípicas não têm.
Eu a descobri. É o sistema nervoso TDAH, uma criação
única e especial que regula a atenção e as emoções de modo diferente do que o
sistema nervoso daqueles sem a condição.
A "Zona TDAH"
Quase todos os meus pacientes e seus familiares gostariam
de abandonar o termo Transtorno de Déficit de Atenção, porque ele descreve o
oposto do que eles sentem em cada momento de suas vidas. É difícil chamar algo
de transtorno quando ele implica em muitas coisas positivas. O TDAH não é um
sistema nervoso lesionado ou defeituoso. É um sistema nervoso que trabalha bem
usando suas próprias regras. Apesar da associação do TDAH com Dificuldades de
Aprendizagem, muitas pessoas com um sistema nervoso TDAH têm QI
significativamente acima da média. Elas também usam esse QI mais alto de modo
diferente das pessoas normais. Na época em que muitas pessoas com a condição
chegam ao colegial, elas são capazes de resolver problemas que bloqueiam
qualquer outra pessoa e saírem com soluções que ninguém tinha visto.
A grande maioria dos adultos com sistema nervoso TDAH não
é claramente hiperativa. Eles são hiperativos internamente.
Os portadores do problema não têm falta de atenção. Eles
prestam muita atenção em tudo. Muitas pessoas com TDAH sem tratamento têm
quatro ou cinco coisas na mente ao mesmo tempo. A marca do sistema nervoso TDAH
não é o déficit de atenção, mas a atenção inconsistente.
Todos os que têm TDAH sabem que podem "entrar na
zona" ao menos quatro ou cinco vezes ao dia. Quando estão "na
zona", não têm nenhuma dificuldade e os déficits de função executiva que
podiam ter antes de "entrar na zona" desaparecem. Os portadores de
TDAH sabem que são espertos e brilhantes, mas nunca estão seguros de que suas
habilidades aparecerão quando precisarem delas. o fato de que os sintomas e
prejuízos vão e vêm ao longo do dia é o traço definidor do TDAH. Ele torna o
transtorno mistificador e frustrante.
As pessoas com TDAH entram na zona principalmente por se
interessarem ou ficarem intrigadas com o que estão fazendo. Eu chamo isso de
sistema nervoso baseado em interesse. Amigos e familiares críticos vêem isso
como ser não confiável ou malandragem. Quando os amigos dizem "Você pode
fazer as coisas de que gosta", eles estão descrevendo a essência do
sistema nervoso TDAH.
Indivíduos com TDAH também entram na zona quando são
desafiados ou lançados em um ambiente competitivo. Às vezes uma tarefa nova ou
diferente atrai sua atenção. Entretanto, a novidade tem vida curta, e tudo fica
velho num instante.
Muitas pessoas com sistema nervoso TDAH podem se engajar
em tarefas e acessar suas habilidades quando a tarefa é urgente - um prazo
final, por exemplo. É por isso que a procrastinação é uma dificuldade quase
universal em pessoas com TDAH. Elas querem fazer o seu trabalho, mas não
conseguem dar início até que a tarefa se torne interessante, desafiadora, ou
urgente.
Como o resto do mundo funciona
As 90 por cento de pessoas sem TDAH do mundo são
denominadas de neurotípicas. Não é que elas sejam normais ou melhores. Sua
neurologia é aceita e aprovada pelo mundo. Para as pessoas com um sistema
nervoso neurotípico, ficar interessada na tarefa, ou desafiada, ou achar a
tarefa novidade ou urgente, ajuda, mas não é um pré-requisito para fazê-la.
As pessoas neurotípicas usam três diferentes fatores para
decidir o que fazer, como dar início e como ficar ligada até o final do
trabalho:
1- O conceito de importância (elas pensas que o trabalho
deve ser feito).
2- O conceito de
importância secundária - elas são motivadas pelo fato de que seus pais,
professores, patrão ou alguém que respeitam pensam que a tarefa seja importante
para ser aceita e completada.
3- O conceito de recompensas por fazer uma tarefa e
consequências ou punições por não fazê-la.
Uma pessoa com sistema nervoso TDAH nunca é capaz de usar
a idéia de importância e recompensas para iniciar e fazer uma tarefa. Ela sabe
o que é importante, ela gosta de recompensas, e não gosta de punições. Mas,
para ela, as coisas que motivam o resto do mundo são meramente chatices.
A incapacidade de usar a importância e as recompensas
para tornar-se motivado tem um impacto durante toda a vida do portador de TDAH:
Como os diagnosticados com a condição podem escolher
entre as múltiplas opções se eles não podem usar os conceitos de importância e
de recompensa ao final para motivá-los?
Como eles podem tomar decisões importantes se os conceitos
de importância e recompensa não são úteis para tomar uma decisão nem uma
motivação para fazer o que eles escolheram?
Esse entendimento explica porque nenhuma das terapias cognitivas e
comportamentais usadas para controlar os sintomas do TDAH têm um beneficio
duradouro. Os pesquisadores vêem o TDAH como um derivado de um sistema nervoso
defeituoso ou baseado em déficit. Eu vejo o TDAH como derivado de um sistema
nervoso que funciona perfeitamente bem com suas próprias regras. Infelizmente,
ele não funciona com nenhuma das regras ou técnicas ensinadas e encorajadas em
um mundo neurotípico. Por isso que:
Os TDAHs não preenchem o padrão do sistema escolar, que é
construído na repetição do que alguém pensa que seja importante e relevante.
Os TDAHs não florescem no emprego que paga as pessoas
para trabalhar no que alguém (principalmente o chefe) pensa que seja
importante.
Os TDAHs são desorganizados porque quase todo sistema
organizacional lá fora é construído sobre duas coisas - priorização e
gerenciamento do tempo - coisas em que os TDAHs não são muito bons.
Os TDAHs têm dificuldade de escolher entre alternativas
porque tudo tem a mesma falta de importância. Para eles, todas as alternativas
parecem a mesma coisa.
Pessoas com um sistema nervoso TDAH sabem que, se elas se
engajarem em uma tarefa, elas conseguem fazer. Longe de serem mercadoria
estragada, pessoas com sistema nervoso TDAH são brilhantes e inteligentes. O
principal problema é que elas receberam um manual do proprietário neurotípico
ao nascerem. Ele funciona para todo mundo, menos para elas.
Não transforme os TDAHs em neurotípicos
As implicações desse novo entendimento são vastas. A
primeira coisa a fazer é para os coaches, médicos e profissionais pararem de
tentar transformar as pessoas com TDAH em pessoas neurotípicas. A meta deve ser
intervir tão cedo quanto possível, antes do indivíduo com TDAH ficar frustrado
e desmoralizado pela batalha em um mundo neurotípico, onde tudo está contra
ele. A abordagem terapêutica que tem a chance de funcionar, quando nada mais
funcionou, deveria ter duas partes:
Ajustar o campo de ação neurológico com medicação, de
modo que o indivíduo com TDAH tenha a
capacidade de atenção, controle de impulso e habilidade de ficar calmo no seu
interior. Para muitas pessoas, isso requer duas medicações diferentes. Os
estimulantes melhoram o desempenho diário dos portadores de TDAH, ajudando-os a
terem as coisas feitas. Não são eficientes para acalmar a hiper-estimulação
interna que muitos deles têm. Para esses sintomas, a maioria das pessoas será
beneficiada pelo acréscimo de uma medicação alfa-agonista, como a clonidina, ao
estimulante.
Entretanto, a medicação não é o suficiente. Uma pessoa
pode tomar a medicação correta na dose correta, mas nada mudará se ela ainda se
aproximar das tarefas com as estratégias neurotípicas.
A segunda parte do controle dos sintomas do TDAH é fazer
o indivíduo criar seu próprio manual do proprietário. O manual do proprietário
genérico que foi escrito tem sido desapontador para as pessoas com essa
condição. Como quase todo mundo, os que têm TDAH crescem e amadurecem com o
tempo. O que interessa e desafia alguém aos sete anos de idade não o
interessará mais aos 27 anos.
Escreva suas próprias regras
O manual do proprietário do TDAH tem de ser baseado nos
sucessos atuais. Como você entra na zona agora? Sob quais circunstâncias você
tem sucesso e progride em sua vida corrente? Em vez de focalizar no que você
falha, você precisa identificar como você entra na zona e funciona em níveis
extraordinários.
Eu geralmente sugiro que meus pacientes carreguem um notepad
ou um gravador de voz por um mês para escrever ou explicar como eles entram na
zona.
Foi porque eles ficaram curiosos? Se for por isso, o que,
especificamente, na tarefa ou na situação os intrigou? Foi porque se sentiram
competitivos? Se foi por isso, o que no oponente ou na situação trouxe os
sentimentos competitivos?
Ao final do mês, muitas pessoas compilaram 50 ou 60
técnicas diferentes que elas sabem que funcionam para elas. Quando chamadas a
trabalhar e a se engajar, elas agora entendem como seu sistema nervoso trabalha
e quais técnicas são úteis.
Eu vi muitas dessas estratégias funcionarem para muitas
pessoas com TDAH, porque elas pararam e olharam para trás, e descobriram os
gatilhos de que precisam para avançar. Essa abordagem não tenta mudar as
pessoas com um sistema nervoso TDAH em pessoas neurotípicas (como se isso fosse
possível), mas dá um auxílio ao longo da vida porque ela é construída com base
em seu potencial.
ADDitude