A medicação trata somente as deficiências neuroquímicas
do déficit de atenção. Nós temos de tratar, também, os problemas psicológicos e
sociais. Por Larry Silver, M.D.
Terminei meu treinamento em psiquiatria geral, seguido
por treinamento em psiquiatria da criança e do adolescente em meados de 1960.
Minha especialidade médica era uma sub-especialidade relativamente nova da
psiquiatria. Naquela época, a teoria de entender e tratar a criança era centrada
na teoria psicanalítica e na psicoterapia psicanaliticamente orientada. Todo
meu treinamento e supervisão clínica foram baseados nesse modelo. Eu era
fascinado pela psicologia da mente. Mas, igualmente, era interessado na
compreensão do funcionamento cerebral, e na relação entre o cérebro e a mente.
Com a permissão do diretor do meu programa de
treinamento, atendi conferências de casos para os residentes em outra nova
sub-especialidade médica, Neurologia da Criança. Lá, um menino tinha uma coisa
chamada de Reação Hipercinética da Infância. Hoje ela é chamada de Transtorno
de Déficit de Atenção e Hiperatividade. A criança era hiperativa e ia mal na
escola. Ela foi medicada com dextroanfetamina e seus sintomas melhoraram.
Eu estava lidando com uma criança com sintomas
semelhantes na terapia. Ela estava com todas as características de Reação
Hipercinética da Infância. Eu discuti minha ideia de tentar a medicação. Meu
supervisor não gostou da ideia de usar medicação em vez de psicoterapia e me
encorajou a me concentrar na "psicodinâmica do caso". Eu estava
frustrado por causa da falta de progresso do caso, então assumi o risco de me
meter em apuros. Em colaboração com o pediatra do meu paciente, dei um jeito
dele começar a tomar a dextroanfetamina. Os pais dele, assim como os
professores e o paciente notaram uma dramática melhora. Ele conseguia ficar
sentado na classe e se concentrar no seu trabalho. Seu comportamento bagunceiro
cessou. Eu não podia explicar ao meu supervisor que tinha ignorado suas
instruções e que tinha utilizado o tratamento medicamentoso. Então, eu tive de
afirmar que a psicoterapia e a orientação dos pais tinha resultado na melhora
dos comportamentos. Meu supervisor elogiou meu trabalho.
Como as Coisas Mudaram
Desde então, a psiquiatria da infância e da adolescência
percorreram um longo caminho. Usamos um modelo biopsicossocial que leva em
conta a função cerebral, assim como as funções, psicológica e social, todas no
contexto da vida da criança dentro da família, na escola e com os colegas. Os
estudos de crianças com TDAH nos ensinaram sobre a relação entre função
cerebral, ou disfunção, a os comportamentos clínicos observados.
Muitos crêem que o TDAH foi o primeiro transtorno a ter
demonstrado ser o resultado de uma deficiência na produção de um
neurotransmissor específico, em áreas específicas do cérebro. A descoberta de
que um grupo de medicamentos - chamados de estimulantes, porque estimulam
células nervosas específicas a produzir mais do seu neurotransmissor
deficitário - causava uma diminuição, ou o desaparecimento, da hiperatividade,
desatenção e/ou impulsividade observadas abriu o campo da psicofarmacologia da
criança.
Atualmente, sabemos de outros transtornos que são o
resultado de uma deficiência de neurotransmissores específicos em áreas
específicas do cérebro. Até hoje, não encontramos um transtorno que pareça ser
o resultado de um excesso de um neurotransmissor produzido em área específica
do cérebro). Para cada um desses transtornos, temos medicamentos que aumentam a
produção do neurotransmissor, levando à melhora. Foram estudos de indivíduos
com TDAH que expandiram nosso conhecimento da neurociência e do tratamento de
doenças neurologicamente estabelecidas.
Lições Aprendidas
Deixem-me voltar à minha história. Depois dos meus anos de
treinamento, ingressei na faculdade de um centro médico universitário. Onze
anos depois, mudei-me para o National Institute of Mental Health (Instituto
Nacional de Saúde Mental). Depois, voltei para um centro médico universitário.
Nesses mais de 40 anos, minhas áreas principais de pesquisa, de trabalhos
clínicos escritos e de atividade clínica foram sobre o TDAH e as Dificuldades
de Aprendizagem. Durante esses anos, o pêndulo gradualmente oscilou dos modelos
psicológicos para os biológicos para a compreensão do comportamento normal e da
psicopatologia. Hoje, o pêndulo está no centro, com atenção igual na disfunção
cerebral e nos desafios psicológicos e sociais.
Agora sabemos que uma deficiência de um neurotransmissor
específico em áreas específicas do cérebro explica as dificuldades encontradas
em uma criança ou um adulto com TDAH. Sabemos que certas medicações corrigem a
deficiência do neurotransmissor, resultando em uma redução ou na eliminação
dessas dificuldades. Também aprendemos que medicamentos isoladamente não são
suficientes. Uma pessoa diagnosticada com TDAH vive em uma família e precisa
funcionar em um mundo real, com todas suas expectativas e demandas. Não podemos
tratar somente a deficiência neuroquímica.
Ainda há médicos, incluindo alguns psiquiatras da
infância e da adolescência, que parecem ter se fixado em um só lado do
problema. Seu foco é muito intenso na medicação e muito fraco na exploração dos
possíveis desafios familiares e psicossociais.
Deixem-me lhes dar um exemplo. Um pai leva seu filho ao
médico de família. O pai diz: "O professor dele diz que ele não consegue
ficar sentado quieto e que não está prestando atenção à aula. Eu vejo as mesmas
coisas em casa." O médico escuta hiperatividade e desatenção e conclui que
é TDAH, e preenche a receita com um estimulante.
No que o médico errou? A inquietação e a desatenção podem ser o resultado de dificuldades com as tarefas acadêmicas, possivelmente devido a uma Dificuldade de Aprendizagem. Ou as dificuldades podem refletir o estresse na família por problemas entre os pais. A hiperatividade poderia ser o resultado de ansiedade, não de TDAH.
No que o médico errou? A inquietação e a desatenção podem ser o resultado de dificuldades com as tarefas acadêmicas, possivelmente devido a uma Dificuldade de Aprendizagem. Ou as dificuldades podem refletir o estresse na família por problemas entre os pais. A hiperatividade poderia ser o resultado de ansiedade, não de TDAH.
Os médicos e os pais devem se lembrar: Nem todos os
indivíduos que são hiperativos, desatentos e/ou impulsivos têm TDAH.
Os comportamentos vistos em crianças, adolescentes ou adultos que têm TDAH podem também ser vistos em indivíduos com outras doenças - depressão, ansiedade, transtorno obsessivo-compulsivo, para citar algumas. Também é possível que tais comportamentos sejam o resultado da frustração do estudante na escola, por causa de uma Dificuldade de Aprendizagem, outro transtorno relacionado com o cérebro.
Os comportamentos vistos em crianças, adolescentes ou adultos que têm TDAH podem também ser vistos em indivíduos com outras doenças - depressão, ansiedade, transtorno obsessivo-compulsivo, para citar algumas. Também é possível que tais comportamentos sejam o resultado da frustração do estudante na escola, por causa de uma Dificuldade de Aprendizagem, outro transtorno relacionado com o cérebro.
Precauções para todos nós
É importante determinar se os comportamentos são neurologicamente
ou psicologicamente baseados. Temos protocolos clínicos em nosso Manual de
Diagnóstico e Estatística de Doenças Mentais (DSM-V) para ajudar a distinguir
entre os dois.
Se a inquietação, desatenção, dificuldades de organização, ou impulsividade se iniciam em certa hora ou ocorrem somente em certas situações, é provavelmente um problema psicológico.
Se os comportamentos são crônicos (você os notou desde a infância) e invasivos (ocorrem em casa, na escola, no trabalho, com os colegas), provavelmente são um problema derivado do cérebro, tal como o TDAH.
Se a inquietação, desatenção, dificuldades de organização, ou impulsividade se iniciam em certa hora ou ocorrem somente em certas situações, é provavelmente um problema psicológico.
Se os comportamentos são crônicos (você os notou desde a infância) e invasivos (ocorrem em casa, na escola, no trabalho, com os colegas), provavelmente são um problema derivado do cérebro, tal como o TDAH.
Para seu médico fazer um diagnóstico de TDAH, ele deve
provar que esses problemas observados são o resultado de problemas relacionados
com o cérebro, não psicológicos, familiares ou derivados do estresse social.
Como isso é feito?
1- Documente quais comportamentos a criança ou o adulto
têm.
2- Mostre que esses comportamentos são crônicos.
3- Mostre que esses comportamentos são invasivos. Se os
comportamentos identificados começaram em certa época da vida ou se ocorrem
somente em certas situações, o TDAH não deve ser considerado.
Têm sido, para mim, 40 anos maravilhosos, fazer parte da
transição de um modelo psicológico de entendimento do comportamento para um
modelo que envolve fatores biológicos, psicológicos e sociais. Em grande parte,
o estudo do TDAH me levou a essa jornada.
Larry Silver, M.D.
ADDitude